1. Introdução
Nos últimos anos, a síndrome de burnout — ou esgotamento profissional — deixou de ser um tema restrito à área médica e passou a ocupar espaço central nas discussões jurídicas e previdenciárias.
O aumento expressivo de afastamentos por transtornos mentais e emocionais tem chamado atenção de empresas, sindicatos e da própria Previdência Social.
Índice
ToggleEm Mauá – SP, o cenário é semelhante ao de outras cidades da região metropolitana de São Paulo. Profissionais de diferentes áreas têm procurado atendimento médico e jurídico em razão do desgaste extremo causado por jornadas intensas, pressões hierárquicas e metas inalcançáveis.
A dúvida mais recorrente, especialmente entre trabalhadores que receberam o diagnóstico, é se a condição garante direito ao auxílio-doença pelo INSS e, em casos de afastamento, estabilidade no emprego.
Este conteúdo foi elaborado para esclarecer essas questões de forma técnica e objetiva.
A seguir, você entenderá:
- O que caracteriza o burnout e como ele é reconhecido pela legislação;
- Quando o trabalhador tem direito ao benefício previdenciário;
- Como o nexo entre a doença e o trabalho influencia a concessão;
- E o que fazer em caso de negativa do INSS ou demissão durante o tratamento.
2. O que é a síndrome de burnout
A síndrome de burnout é um distúrbio mental e físico provocado pelo estresse crônico relacionado ao ambiente de trabalho.
Ela se manifesta de forma progressiva, comprometendo a saúde emocional e o desempenho profissional, e pode se agravar a ponto de impedir o trabalhador de continuar exercendo suas funções.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) incluiu o burnout na Classificação Internacional de Doenças (CID-11) sob o código QD85, reconhecendo-o como uma síndrome ocupacional — isto é, relacionada exclusivamente à atividade profissional.
No Brasil, o Ministério da Saúde e o Ministério do Trabalho e Previdência também reconhecem o burnout como doença ocupacional equiparada a acidente de trabalho, nos termos do artigo 20, §1º, da Lei nº 8.213/1991.
Essa equiparação tem consequências jurídicas diretas:
- O trabalhador tem direito ao auxílio-doença acidentário (espécie B91);
- O período de afastamento conta para aposentadoria e FGTS;
- E, após o retorno, há garantia de estabilidade de 12 meses no emprego.
Em outras palavras, o burnout não é um problema apenas de saúde — é uma questão legal que exige proteção social e reparação adequada.
3. Como o burnout é diagnosticado e comprovado
O diagnóstico do burnout deve ser feito por médico psiquiatra ou psicólogo clínico, com base em critérios técnicos e observação prolongada.
Os sintomas mais comuns incluem:
- Exaustão física e emocional intensa;
- Irritabilidade constante;
- Dificuldade de concentração e perda de produtividade;
- Insônia e sintomas físicos recorrentes (como dores de cabeça e taquicardia);
- Sensação de fracasso ou inutilidade profissional.
Do ponto de vista jurídico, o diagnóstico é apenas o primeiro passo.
Para que o trabalhador obtenha o reconhecimento previdenciário, é necessário comprovar que o quadro tem relação direta com as condições de trabalho.
Essa comprovação é feita por meio do nexo causal, conceito previsto no artigo 21-A da Lei nº 8.213/1991, que permite ao INSS e à Justiça reconhecerem o vínculo entre a atividade profissional e a doença.
Entre os principais documentos utilizados estão:
- Laudo médico detalhado, com diagnóstico (CID) e período de afastamento;
- CAT (Comunicação de Acidente de Trabalho), emitida pela empresa, sindicato ou pelo próprio trabalhador;
- Relatórios psicológicos e de acompanhamento terapêutico;
- Registros internos da empresa, como metas abusivas, advertências injustificadas e jornadas excessivas;
- Declarações de colegas de trabalho e superiores hierárquicos.
Essas provas ajudam a demonstrar que o esgotamento não surgiu por fatores externos à vida profissional, mas sim pelo ambiente laboral inadequado ou pela pressão organizacional.
4. Diferença entre burnout e outras doenças emocionais
É importante destacar que o burnout não é sinônimo de depressão ou ansiedade, embora possa coexistir com esses transtornos.
A principal diferença está na origem e no contexto.
- A depressão pode ter causas diversas, incluindo fatores pessoais e genéticos;
- A ansiedade pode se manifestar em diferentes contextos da vida;
- O burnout, por sua vez, está sempre relacionado exclusivamente ao trabalho.
Essa distinção é fundamental para fins previdenciários.
Quando a incapacidade decorre de depressão ou ansiedade sem relação comprovada com o trabalho, o benefício concedido será o auxílio-doença comum (espécie B31).
Já nos casos de burnout, em que o nexo ocupacional é reconhecido, o benefício correto é o auxílio-doença acidentário (B91) — que oferece vantagens adicionais, como a estabilidade no emprego após o retorno.
5. Direito ao auxílio-doença em Mauá – SP
Em Mauá, o trabalhador com diagnóstico de burnout pode solicitar o auxílio-doença diretamente pelo portal Meu INSS, sem necessidade inicial de comparecimento presencial.
O pedido deve ser acompanhado de:
- Atestado médico legível, com CID e tempo de afastamento recomendado;
- Documento de identidade e CPF;
- Carteira de trabalho e comprovante de contribuição;
- Relatórios médicos complementares (se houver).
Após o envio, o INSS pode agendar uma perícia médica presencial na Agência da Previdência Social de Mauá – SP, localizada na Rua dos Bandeirantes, 271 – Vila Bocaina.
Durante a perícia, o médico perito avaliará:
- O diagnóstico apresentado;
- O grau de incapacidade;
- E a existência (ou não) de nexo entre o trabalho e o adoecimento.
Caso o INSS reconheça o burnout como doença ocupacional, o segurado terá direito ao auxílio-doença acidentário (B91).
Se o nexo não for reconhecido, o benefício poderá ser concedido como auxílio-doença comum (B31), desde que preenchida a carência mínima de 12 contribuições.
6. O que muda quando o burnout é reconhecido como doença ocupacional

Quando o burnout é reconhecido como doença ocupacional, os efeitos legais vão além do pagamento do benefício.
Esse reconhecimento altera a forma como o afastamento é tratado pelo INSS e pelo empregador.
A legislação previdenciária — especialmente o artigo 118 da Lei nº 8.213/1991 — garante ao trabalhador afastado por motivo de doença relacionada ao trabalho:
- Estabilidade no emprego por 12 meses após o retorno;
- Depósito do FGTS durante todo o período de afastamento;
- Contagem do tempo de contribuição para fins de aposentadoria;
- E a emissão obrigatória da CAT (Comunicação de Acidente de Trabalho), mesmo que o empregador se recuse a fazê-lo.
Essa estabilidade é um direito garantido por lei e confirmada pela Súmula nº 378, II, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que determina:
“São pressupostos para a concessão da estabilidade acidentária: o afastamento superior a 15 dias e a percepção do auxílio-doença acidentário, sendo desnecessária a manutenção do mesmo contrato de trabalho.”
Em outras palavras, mesmo que o empregador alegue encerramento do vínculo, a estabilidade continua válida, e o trabalhador pode requerer reintegração ou indenização substitutiva.
7. Como funciona a estabilidade após o retorno ao trabalho
A estabilidade acidentária tem duração de 12 meses contados a partir do retorno do empregado às suas funções.
Durante esse período, a empresa não pode dispensar o trabalhador sem justa causa, sob pena de nulidade da demissão.
Na prática, isso significa que:
- Caso o trabalhador seja demitido, pode requerer reintegração judicial;
- Se preferir não retornar, pode pleitear indenização equivalente ao período de estabilidade;
- E, se o empregador insistir na demissão, responderá judicialmente por dano moral e descumprimento da norma trabalhista.
O objetivo da estabilidade é garantir tempo de recuperação, evitar reincidência do quadro e assegurar condições dignas de readaptação.
A Justiça do Trabalho tem reconhecido com frequência esse direito, especialmente em casos de burnout, depressão e ansiedade relacionados ao ambiente corporativo.
Em Mauá e na região do ABC Paulista, há diversas decisões favoráveis nesse sentido, com base na interpretação conjunta da Lei nº 8.213/1991, da CLT e do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, III, da Constituição Federal).
8. O que fazer se o INSS negar o auxílio-doença por burnout
A negativa do benefício é uma situação recorrente — inclusive em casos de diagnóstico confirmado.
O principal motivo é a ausência de nexo técnico reconhecido pelo perito, ou a interpretação equivocada dos relatórios médicos.
Quando isso ocorre, o trabalhador pode agir em duas frentes distintas:
1. Recurso administrativo
O recurso deve ser apresentado pelo portal Meu INSS no prazo de 30 dias após a negativa.
É fundamental anexar:
- Relatórios médicos complementares;
- Atestados atualizados;
- Declarações sobre o ambiente de trabalho;
- E, se possível, uma CAT emitida pela empresa ou sindicato.
O processo é reavaliado pela Junta de Recursos da Previdência Social, que pode confirmar ou reformar a decisão inicial.
2. Ação judicial
Se o recurso administrativo for negado — ou se houver urgência —, é possível ingressar com ação judicial previdenciária.
Nesse caso, o pedido será analisado por um perito judicial, que realiza nova avaliação independente, com maior profundidade técnica.
Em Mauá – SP, os processos previdenciários tramitam na Justiça Federal de Santo André, que abrange as demandas da região do ABC.
Quando a Justiça reconhece o direito ao benefício, o INSS é obrigado a pagar as parcelas retroativas desde a data do requerimento administrativo.
9. Responsabilidade da empresa nos casos de burnout
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) impõe ao empregador o dever de preservar a saúde física e mental dos trabalhadores, conforme previsto no artigo 157.
Isso inclui adotar medidas preventivas, fiscalizar o ambiente de trabalho e reduzir riscos psicossociais.
Quando a empresa contribui, direta ou indiretamente, para o adoecimento — seja por pressão psicológica, metas abusivas, assédio moral ou falta de apoio organizacional —, ela pode ser responsabilizada civilmente.
Entre as consequências estão:
- Indenização por danos morais e materiais;
- Pensão vitalícia ou temporária, nos casos de incapacidade permanente;
- E eventual ação regressiva do INSS, conforme o artigo 120 da Lei nº 8.213/1991, quando há negligência empresarial comprovada.
A Justiça do Trabalho tem reconhecido, cada vez mais, que o burnout é consequência direta de falhas na gestão corporativa.
Por isso, a adoção de programas de saúde mental, pausas regulares e acompanhamento psicológico deixou de ser uma recomendação — tornou-se uma obrigação legal e ética.
10. Prevenção e políticas de saúde mental nas empresas
A prevenção é o caminho mais eficaz para evitar o burnout.
Empresas em Mauá e na região do ABC têm buscado implementar políticas de saúde ocupacional, mas muitas ainda falham por falta de estrutura e treinamento.
Entre as boas práticas reconhecidas estão:
- Programas internos de apoio psicológico (EAPs);
- Monitoramento periódico do estresse laboral;
- Flexibilização de metas e horários, conforme necessidade individual;
- Treinamento de lideranças para identificação precoce de sinais de exaustão;
- E o cumprimento das Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho, especialmente a NR-17 (Ergonomia).
O descumprimento dessas medidas pode configurar omissão empresarial e fundamentar ações judiciais por dano moral ou doença ocupacional.
11. Conclusão
O diagnóstico de síndrome de burnout representa mais do que uma condição médica — é um reflexo direto das relações de trabalho modernas e da pressão constante por resultados.
No campo jurídico, ele demanda atenção e conhecimento técnico, tanto do ponto de vista previdenciário quanto trabalhista.
Quem reside em Mauá – SP e enfrenta esse quadro pode ter direito a:
- Auxílio-doença previdenciário ou acidentário;
- Estabilidade no emprego após o retorno;
- E, em alguns casos, indenização por danos morais e materiais.
Se o benefício for negado pelo INSS ou se o empregador recusar o reconhecimento do nexo ocupacional, o caminho judicial é a via mais eficaz para garantir o direito.
A experiência mostra que, nesses casos, as decisões judiciais são amplamente favoráveis, principalmente quando há documentação médica consistente e prova das condições de trabalho.
Mais do que um direito individual, o reconhecimento do burnout é um passo importante na construção de ambientes laborais mais humanos, seguros e saudáveis — onde a produtividade não esteja acima da dignidade.




