Como combater o racismo institucional e recreativo no ambiente de trabalho?

Racismo institucional e recreativo no ambiente de trabalho

Nada justifica o tratamento grosseiro e desrespeitoso, a qualquer subordinado. O combate à discriminação racial nas relações de trabalho exige a tomada de consciência da existência do racismo estrutural. Baseado em uma inaceitável lógica sistematizada de desqualificação e invisibilização racial, voltada à manutenção de estruturas sociais hierarquizantes e discriminatórias”, e “a adoção de ‘humor’ na conduta não elide a ocorrência do racismo.

Haja vista que também nessa situação existem os mecanismos presentes em outros tipos de racismo e que igualmente se destinam a legitimar a opressão racial e a manutenção das estruturas sociais excludentes.

Como sabemos, o Brasil foi o último país do mundo ocidental a acabar formalmente com a escravidão negra. Isso quer dizer que, até fins do século XIX (1888), pessoas negras eram tratadas como coisas, e, portanto, como seres inferiores a humanos.

Se 135 (cento e trinta e cinco) anos atrás essa abjeta postura era tida como “normal”, nada mais coerente que hoje, apenas duas ou três gerações depois, haja bisnetos, netos e até filhos de pessoas que conviveram com essa realidade, e que, portanto, foram criados sob a repugnante ideia de que a escravidão era um modo aceitável de se viver em sociedade.

Essa mentalidade, por certo, não só ainda está entranhada na sociedade brasileira, como a moldou ao longo do último século.

É por isso que ainda hoje, até mesmo sem se aperceber disso, grande parte das pessoas mantêm inúmeros costumes racistas, identificados por expressões como “a coisa tá preta”, “denegrir”, “criado-mudo”, “chuta que é macumba”, “eu não sou tuas negas”, “feito nas coxas”, “humor negro”, “lista negra”, “nasceu com um pé na cozinha”, “cabelo ruim”, etc.

Expressões extraídas da “Cartilha do Dia Internacional de Combate à Discriminação Racial – Expressões racistas a serem evitadas”, disponível em https://www.gov.br/ebserh/pt-br/comunicacao/noticias/dia-internacional-contra-a-discriminacao-racial-e-momento-de-reflexao-e-luta/21032023-cartilha-contra-a-discriminacao-racial-hc-ufpe.pdf.

Aliás, é por conta dessa visão que ainda hoje temos um número infinitamente pequeno de pessoas negras ocupando posições de poder com destaque na sociedade, mesmo sendo estatisticamente confirmado que a população negra é maioria no Brasil, seja nos meios acadêmicos, seja profissionais. Aliás, o próprio Poder Judiciário é uma demonstração inafastável disso, seja porque não há, vale frisar, um único Ministro negro no STF, seja porque, muito recentemente, já houve Ministro do Supremo se referindo a colega como “negro de primeira linha” ou mencionando ter “inveja branca” de outras pessoas, duas expressões inequivocamente racistas.

Mas não é só isso.

É graças a essa mentalidade racista dominante que as próprias instituições, aqui entendidas não apenas no sentido de “Estado”, mas nos “modos de orientação, rotinização e coordenação de comportamentos que tanto orientam a ação social como a torna normalmente possível, proporcionando relativa estabilidade aos sistemas sociais” (HIRSCH, Joachim. Forma política, instituições políticas e Estado – I. Crítica Marxista, n. 24, 2007. p. 26), buscam estabelecer desvantagens ou privilégios relacionados à raça.

É nesse sentido, aliás, que são normalizados certos padrões de conduta, configurando-se como anomalias os comportamentos que se desviam desse caminho. Cria-se, em razão de certo pensamento dominante (que, no caso específico da raça, é aquele relacionado a uma espécie de “supremacia branca”), um hegemônico modo de condução das relações sociais, que se observa, exemplificativamente, em certos padrões de religião, costumes e, para o que interessa ao presente feito, de estética. A essa postura dá-se o nome de racismo institucional, que reflete o racismo estrutural, aspecto brilhantemente elucidado por Silvio Luiz de Almeida:

“No caso do racismo institucional, o domínio se dá com o estabelecimento de parâmetros discriminatórios baseados na raça, que servem para manter a hegemonia do grupo racial no poder. Isso faz com que a cultura, os padrões estéticos e as práticas de poder de um determinado grupo tornem-se o horizonte civilizatório do conjunto da sociedade. Assim, o domínio de homens brancos em instituições públicas – o legislativo, o judiciário, o ministério público, reitorias de universidades etc. – e instituições privadas – por exemplo, diretoria de empresas – depende, em primeiro lugar, da existência de regras e padrões que direta ou indiretamente dificultem a ascensão de negros e/ou mulheres, e, em segundo lugar, da inexistência de espaços em que se discuta a desigualdade racial e de gênero, naturalizando, assim, o domínio do grupo formado por homens brancos” (ALMEIDA, Silvio. Racismo estrutural. São Paulo: Pólen, 2019. p. 27-28).

No tocante ao “racismo estrutural” as ofensas racistas são comumente pronunciadas de modo “inocente” em “tom de brincadeira”, dando ensejo ao denominado “racismo recreativo”, como tom de brincadeira. Essa prática potencializa ainda mais a exposição do ofendido e torna o ambiente tóxico à vítima.

Insta salientar que a vida em sociedade não admite essa conduta. Ademais, coma promulgação da Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância (Decreto nº 10.932/2022) ganhou status de emenda constitucional.

Assim, o Estado Brasileiro está comprometido a prevenir, eliminar, proibir e punir, de acordo com suas normas constitucionais e com as disposições da referida Convenção, todos os atos e manifestações de racismo, discriminação racial e formas correlatas de intolerância.

Quando o empregado sofre por ato discriminatório, a ação trabalhista tem natureza para fixar a reparação do dano moral tem caráter dúplice: visa compensar a vítima do sofrimento experimentado e sancionar o ofensor pelo ato ilícito praticado, inibindo-o de realizá-lo novamente.

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